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Nota sobre a Medida Provisória 881


por Renata Mendes e Fernanda Magalhães

A Medida Provisória (MP) 881, que tornou-se conhecida como MP da Liberdade Econômica, cria princípios e altera leis e regulamentações com os objetivos de trazer racionalidade à ação regulatória do Estado sobre o exercício de atividades econômicas e de promover a melhoria do ambiente de negócios. Segundo o governo, a MP irá favorecer a atração de investimentos e o surgimento de novos negócios no país, com o potencial de geração de 3,7 milhões de novos empregos e crescimento do PIB em 7% em 10 anos (saiba mais neste link)*.

Publicada pelo governo e em vigor desde o dia 30 de abril de 2019, a MP da Liberdade Econômica foi aprovada pelo Senado Federal na última quarta-feira, 21 de agosto (saiba mais neste link). Agora, o texto aguarda a sanção presidencial.

Os principais impactos desta nova lei serão sobre:

Fim de atos de liberação para negócios de baixo risco: ficam dispensadas de atos de liberação – tais quais licenças, alvarás e vistorias prévias – as atividades econômicas de baixo risco – como cabeleireiros e comércio atacadista de vestuário. Caberá aos municípios definir quais serão atividades econômicas serão de baixo risco. Na ausência de regulamentação sobre o tema, será aplicada a regulamentação federal.

Registro automático de empresas: estabelece o arquivamento automático do registro de empresas cujas viabilidades de nome e local estiverem aprovadas e utilizarem de contratos padrão elaborados pelo Departamento de Registro Empresarial (DREI).

Exercício de atividades econômicas em qualquer dia e horário:  não haverá restrições ou cobranças adicionais ao exercício de atividades econômicas em qualquer horário e dia da semana, inclusive em feriados, desde que respeitados as devidas regulamentações.

Permissão para testes: é permitido o teste de produtos/serviços inovadores para um grupo restrito de pessoas sem a necessidade de autorização prévia do poder público por meio de atos de liberação, desde que não haja riscos para saúde e segurança.

Aprovação tácita: em casos de silêncio das autoridades mediante solicitações de atos de liberação de atividades econômicas após o prazo estipulado, haverá a aprovação tácita do pedido.

A livre iniciativa: impede o abuso regulatório da administração pública, definido no texto como  a criação de medidas que reduzam a concorrência e a competitividade, como por exemplo: a exigência de especificações técnicas que não estejam diretamente relacionadas ao produto/serviço fornecido ou a adoção de regulamentações que impeçam a inovação e o uso de novas tecnologias.

As análises de impacto regulatório: com o objetivo de garantir a razoabilidade do impacto econômico de atos regulatórios – como decretos, resoluções e portarias -, tornam-se obrigatórias as análises de impacto dessas medidas.

A personalidade jurídica: altera as regras para desconsideração da personalidade jurídica no caso de dívidas de uma empresa, tornando mais restritos os casos em serão responsabilizadas por elas as pessoas físicas.

Negócios jurídicos: define que um acordo formalizado em um negócio paritário deve ser interpretado, revisado e rescindido conforme pactuação entre as partes, ainda seja discrepante das disposições previstas em lei.

Fundos de investimentos: para trazer mais segurança jurídica aos investidores, altera as possibilidades de responsabilização de cotistas em caso de dívidas em um fundo de investimento.

Criação de comitê e redução do contencioso tributário: cria um Comitê responsável por editar súmulas que serão vinculantes à administração tributária federal. Busca também reduzir o contencioso tributário ao permitir que a procuradoria desista de recursos em que não constem novos fatos relevantes e/ou  exista decisão ou jurisprudência favoráveis ao particular.

Documentos eletrônicos: o armazenamento de documentos públicos em formato eletrônico passa a ter o mesmo valor probatório de documentos físicos, desde que respeitadas as especificações em regulamento.

Alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): é definida que a Carteira de Trabalho deverá ser emitida pelo Ministério da Economia, preferencialmente em meio eletrônico, e são alteradas as regras para registro de trabalho – o ponto -, que tornam-se obrigatórias apenas para empresas com mais de 20 funcionários. A permissão para o trabalho aos domingos, um dos dispositivos mais polêmicos incluídos no texto ao longo de sua tramitação, foi excluída da medida provisória durante a sua aprovação no Senado.

Substituição do e-Social e do Bloco K: o sistema que unifica o envio de dados fiscais, previdenciários e trabalhistas sobre trabalhadores será substituído por sistema de informações mais simples e menos burocrático. Serão também simplificadas as obrigações acessórias referentes à versão digital do Livro de Controle de Produção e Estoque da Receita Federal (Bloco K).

O texto aprovado pelo Congresso Nacional também institui a Declaração dos Direitos da Liberdade Econômica, que reforça alguns princípios como a liberdade de precificação, a presunção da boa fé do particular – isto é, a integridade de suas ações e a credibilidade das informações prestadas –  perante o estado, o direito ao tratamento isonômico e a não exigência de certidões que não estiverem previstas em lei.

Estes pontos deverão ser observados, como menciona o Projeto de Lei, “[..] na aplicação e interpretação, do direito civil, empresarial, econômico, urbanístico e do trabalho nas relações jurídicas que se encontrem no seu âmbito de aplicação e na ordenação pública, inclusive sobre exercício das profissões, comércio, juntas comerciais, registros públicos, trânsito, transporte e proteção ao meio ambiente.”

A análise de especialistas aponta que a Medida Provisória 881 é importante ao sinalizar para investidores e empreendedores os esforços do governo para desburocratização e melhoria do ambiente de negócios. Destacam também que diversos aspectos abordados na MP podem ser considerados a reafirmação de princípios já presentes no artigo 170º da constituição e em jurisprudências, mas cujas estratégias para implementação são vagas. Além disso, há diversos pontos no texto da lei que requerem regulamentação adicional a níveis federal, estadual e municipal – como, por exemplo, o armazenamento eletrônico de documentos.

Por isso, entende-se que serão necessários esforços do governo para que os dispositivos da MP da Liberdade Econômica sejam de fato implementados. O principal deles é a promoção de uma ampla mudança cultural, com foco na desburocratização, não apenas em servidores públicos da administração pública federal, mas também dos estados e  municípios.

É preciso também que haja o alinhamento do  judiciário às determinações da lei, já que será este o poder responsável por fiscalizar e resolver conflitos decorrentes de sua aplicação. E as decisões tomadas afetam diretamente a predisposição de agentes públicos para aplicá-la.

A MP da Liberdade Econômica e a atuação da Endeavor em Desburocratização

 Dentre as frentes trabalhadas pela Endeavor para melhoria do ambiente de negócios brasileiro, a nossa atuação em desburocratização foi diretamente impactada pela MP 881. Destacamos as mudanças a seguir:

  • Fim da exigência de atos de liberação para atividades econômicas de baixo risco

A isenção de autorização prévia – representada por atos de liberação como licenças e alvarás – para o início do funcionamento de empresas de baixo risco deve representar um grande avanço para a melhoria dos processos de abertura de empresas na maior parte dos municípios brasileiros, já que reduzirá as obrigações do empreendedor de três grandes etapas – viabilidade, registros tributários e licenças – para apenas uma: o cadastro tributário. Essa simplificação deve aumentar o número de negócios atuando dentro da formalidade e conferir celeridade até ao processo de empresas de médio e alto risco, ao diminuir o passivo de análise dos servidores públicos.

Por outro lado, essa medida pode gerar grandes desafios para a sua implementação, principalmente para aqueles municípios que são exemplo em desburocratização. O primeiro desafio é uma redução brusca na arrecadação municipal decorrente da emissão de alvarás, licenças e dispensas, já que os negócios de baixo risco representam, em média, 80% das novas empresas abertas em municípios brasileiros. Em um contexto de crise das contas públicas e sem fontes alternativas de arrecadação, há o perigo de que os órgãos/secretarias sejam bastante restritivos ao criar as suas classificações de baixo risco, de modo a diminuir o número de empresas dispensadas de alvarás.

Além disso, o fim da exigência da consulta de viabilidade de local pode ser um obstáculo para os empreendedores, que deverão entender em meio a planos diretores geralmente bastante complexos, em qual local a atividade econômica que se pretende desenvolver é permitida; e para o governo, que utilizava as informações recebidas dessa consulta para conhecimento e planejamento urbano. Embora informações sobre o local de funcionamento do negócio ainda sejam fornecidas no cadastro tributário municipal, muitas vezes não há trocas de dados entre as secretarias e o processo de integração de sistemas é longo e envolve custos.

  • Registro automático de empresas

O objetivo do registro automático de negócios é dar celeridade ao procedimento de arquivamento do ato constitutivo da empresa, realizado pela Junta Comercial. Ele determina o deferimento automático do registro de empresas que já tiverem realizado a consulta de viabilidade de nome e local e utilizarem um contrato padrão elaborado pelo DREI.

O impacto do dispositivo será positivo, porque irá reduzir o do tempo de registro para a maior parte das empresas, que atualmente têm seus pedidos deferidos somente após a análise. Pedidos de registro que apresentam problemas incorrigíveis atualmente representam menos de 1%, segundo a Federação Nacional das Juntas Comerciais (FENAJU), e poderão ser cancelados pelas Juntas posteriormente.

Embora os desafios de implementação sejam menores do que os do fim dos atos de liberação, ainda é importante o suporte do governo às Juntas Comerciais. O registro automático de empresas foi criado pela Medida Provisória 876, que perdeu a sua validade ao não ser votada pelo Congresso dentro do prazo de 120 dias e teve seu texto incorporado à Medida Provisória 881.

Também são significativos para diminuição da burocracia e para garantir maior simplicidade e segurança jurídica para os empreendedores, os mecanismos para a aprovação tática de processos, o armazenamento digital de documentos e a reafirmação da boa fé e do tratamento isonômico. Estes pontos atacam desafios comuns aos empreendedores ao lidar como o poder público, como, por exemplo: longo tempo de resposta às requisições realizadas, custos com cópias e autenticação de documentos e subjetividade nas análises de solicitações.

* Estimativa do governo de acordo com a versão do texto enviada ao Congresso Nacional, que sofreu diversas alterações ao longo de sua tramitação.

Renata Mendes é Gerente de Advocacy na Endeavor Brasil

Fernanda de Melo Magalhães é Advocacy Analyst na Endeavor Brasil

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