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O Ideb e a educação para o desenvolvimento


por Ednilson Silva Felipe

Durante muitos anos, para muitos, o processo de desenvolvimento estaria ligado apenas ao crescimento econômico. Por esse tempo, acreditava-se que bastavam os esforços para que o PIB apresentasse taxas positivas e, com isso, o desenvolvimento econômico estaria garantido.

Porém, sabemos hoje que as variáveis econômicas isoladamente não são suficientes para promover o desenvolvimento econômico e socialmente justo. Aprendemos, ao longo do tempo, que o desenvolvimento envolve fatores econômicos, sociais, culturais e políticos. E mais recentemente aprendemos que envolve também fatores ecológicos.

Desde a última metade do século passado – instituída a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1945 – consolidou-se a convicção de que o ser humano tem, por princípio, dois direitos fundamentais e que devem ser perseguidos por todos os governos: um desenvolvimento econômico socialmente justo e uma educação de qualidade. Educação de qualidade e desenvolvimento estão intimamente ligados, de forma que não há um sem o outro.

Na literatura econômica que trata do desenvolvimento, argumenta-se que para que este aconteça, é preciso mobilizar recursos tangíveis e intangíveis, conforme abaixo:

Recursos para o Desenvolvimento

Recursos tangíveis Capital natural e capital produtivo
Recursos intangíveis Capital social e capital intelectual

Mas numa época que se caracteriza por uma “economia do conhecimento”, “economia do aprendizado” e “economia da informação”, o capital intelectual, que é construído por uma educação de qualidade (em todos os níveis escolares) é o principal insumo. Não há recursos naturais e nem máquinas avançadas que garantam o desenvolvimento econômico e social justo e inclusivo sem uma educação de qualidade comprometida com uma formação de alto nível da sociedade.

Uma educação de qualidade forma pessoas engajadas em novos aprendizados e mais preparadas para novos desafios. Onde há pessoas assim, há tanto desenvolvimento pessoal, quanto há novas possibilidades de desenvolvimento socioeconômico.

Contudo, mesmo entendendo aqueles princípios e o direito a esse tipo de educação e também que ela é necessária, transformá-los em realidade concreta tem sido um enorme desafio para governos (municipal, estadual e federal) e para toda a sociedade.

No Brasil, historicamente, dois eram os grandes desafios na educação: aumentar o acesso das pessoas à escola e avançar na qualidade da educação do país. A questão do acesso está praticamente resolvida.

Em termos de qualidade, porém, os desafios parecem aumentar e residem nas altas taxas de reprovação, na elevada taxa de abandono da escola sem conclusão do ensino médio e no baixo desempenho nos exames padronizados (Ideb, Prova Brasil, etc). O sistema educacional brasileiro praticamente eliminou a exclusão da escola, mas hoje está estigmatizado: parece ser pesado demais para avançar na velocidade necessária aos grandes desafios da atualidade.

São esses elementos que se refletem no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). A culpa não é do indicador, mas esperar a sua divulgação é quase como esperar uma tragédia anunciada.  Por isso, quanto a esse índice, é importante fazermos uma reflexão baseada em dois pontos.

Em primeiro lugar, precisamos encarar esse índice de uma forma diferente do que estamos acostumados e fizemos até agora.

Geralmente, temos olhado para esse índice como forma de hierarquizar quem está melhor e quem está pior. Mais que isso: olhamos para os melhores como exceção à regra. E é um equívoco. O que precisamos é olhar para aquelas cidades que alcançaram notas mais elevadas e nos inspirarmos em seus projetos, programas e ações para que, com a devida adaptação, possam ser aplicados nas cidades de desempenho menor. E há casos em que se inspirar.

Oeiras no Piauí, por exemplo, obteve uma rápida evolução na avaliação do ensino fundamental. Em 2013, a nota da cidade nos anos iniciais (1º ao 5º ano) foi 4,1 pontos e, em 2017, subiu para 7,1 pontos. Em Sobral, no Ceará, no ensino fundamental (anos iniciais 1º ao 5º ano) o município alcançou a média 9,1 na avaliação. Essas cidades mudaram seus modelos de gestão escolar: implementaram avaliações periódicas, ações pedagógicas de acordo com as necessidades e promoveram a valorização do magistério.

No Espírito Santo, em 2009, Vila Pavão ocupava a 1997ª posição no ranking dos municípios brasileiros e a 38ª posição entre os municípios capixabas. Em 2017, saltou para a posição 537ª no Brasil e para a 1º colocação no ranking estadual. Precisamos pensar que quando os municípios agem dessa forma, não estão apenas resolvendo um gargalo na educação: estão abrindo portas para o seu desenvolvimento.

Assim, devemos abandonar a hierarquização. Aos municípios com notas melhores, olhamos não como superiores, mas como inspiração. Na outra ponta, não como piores, mas como municípios que carecem de ações sistematizadas e coletivas. Melhorar o desempenho no Ideb não é apenas aumentar a nota, mas construir possibilidades de desenvolvimento futuro.

Precisamos, também, reverter à lógica de olhar para os baixos resultados do Ideb procurando culpados (geralmente governos e professores). Não há. É preciso refletir se o baixo desempenho não se deve, além de outras coisas, a termos uma escola tradicional isolada da sociedade, na qual o ensino muitas vezes é compartimentalizado em disciplinas que não se comunicam e com o uso de métodos tradicionais. Ao invés de achar culpados, vamos reverter os resultados a partir de uma escola aberta à sociedade, como espaço para atividades interdisciplinares e aprendizado com base em problemas práticos. Os resultados ruins da escola são sempre fruto de decisões (ou descasos) coletivas. As soluções em busca de melhores resultados também. Apontar culpados e não contribuir para a solução não nos leva adiante.

Em segundo lugar, precisamos aprofundar a visão de que a escola também é fruto do seu contexto. Não há como escapar: a escola também é uma reprodução cultural e social e recria relações sociais e produtivas da sociedade.

Os resultados do ideb não escapam a essa realidade. Em parte ele também reflete as vulnerabilidades sociais, a pobreza, a fome e fragmentação que existe na sociedade. Esses problemas não podem ser resolvidos com a cultura de procurar culpados. Em alguns desses lugares, a trajetória estudantil é vista como um “fracasso programado”. Não há avanços em educação de qualidade sem que haja também combate a pobreza extrema. E ainda: o baixo desempenho no Ideb também pode apontar para falta de uma política pública em infraestrutura (saneamento, energia, pavimentação, internet).

A educação de baixa qualidade tem implicações diretas nas desigualdades sociais. E as desigualdades sociais aprisionam localidades numa situação de baixa qualidade educacional. Se retroalimentam.

Assim, muito além do que perseguir notas altas no Ideb, é possível dizer que o papel mais importante da educação e das escolas é formar pessoas comprometidas e desejosas de novos aprendizados, porque são essas mesmas pessoas que se comprometerão com o desenvolvimento econômico socialmente justo e inclusivo das regiões que habitam. É por essa via que surgirão novas visões de políticas educacionais mais contemporâneas de uma realidade econômica que se revoluciona continuamente.

Patamares mais elevados de desenvolvimento econômico e social somente serão alcançados com uma educação comprometida em imprimir em cada cidadão, desde criança, uma vontade incontrolável de sempre aprender. O que ainda nos falta é entender que, para além de elevar o desempenho dos alunos nas avaliações institucionais, o desafio que nos une é o de promover uma educação inclusiva e de qualidade.

Ednilson Felipe é professor doutor de economia na Universidade Federal do Espírito Santo

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