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Coronavírus e a economia: entenda a relação


por Rodrigo Taveira Rocha

Nos últimos dias de fevereiro o Brasil, que parecia um pouco mais distante da epidemia e dos efeitos de mercado que o novo coronavírus vem causando ao mundo, sentiu o impacto da doença e das incertezas geradas por ela.

Na quarta-feira de cinzas o primeiro caso de infecção foi confirmado no país, em um homem que mora em São Paulo e voltou de viagem à Itália. No mesmo dia, passado o feriado de carnaval, o mercado financeiro brasileiro voltou às atividades com queda de exatos 7,0% no índice Ibovespa.

As principais baixas foram nas ações das companhias aéreas[1] e de empresas mais ligadas à economia global, como frigoríficos e produtoras de commodities. Foi o pior dia de operação da bolsa de valores de São Paulo desde o dia 18 de maio de 2017[2], quando caiu 8,8%.

Em todo o mundo já são cerca de 89 mil casos confirmados em quase 70 países, com um total de 3,0 mil mortes (dados de 02/03). Apesar de ainda não ser possível dimensionar os padrões da doença, o vírus é apontado como de rápida transmissão, mas com letalidade moderada.

Número de casos confirmados do coronavírus COVID-19, por país

Nota: números atualizados até 27/02/2020.
Fonte: Organização Mundial da Saúde e Johns Hopkins University.
Elaboração própria.

As incertezas causadas pela epidemia, tanto do ponto de vista da saúde pública quanto dos efeitos econômicos, materializaram-se um pouco mais nas últimas semanas, com aumento no número de infectados e maior propagação global da doença. Dados da Organização Mundial da Saúde mostram que o número de novos casos diários entrou em trajetória de queda na China desde o dia 20 de fevereiro, mas em outras regiões do mundo há crescimentos diários desde então.

Os efeitos econômicos são sentidos no mercado financeiro com grandes perdas nas bolsas de valores mundo afora, e também na economia real, com a suspensão da produção e da oferta de serviços, principalmente, na China, mas também em outros países asiáticos como a Coreia do Sul e o Japão, e na Itália, que se tornou um país com grande quantitativo de infectados.

Informações da China relatam que em meados de fevereiro o tráfego de passageiros nas estradas, ferrovias e aeroportos era de 20% do total registrado no mesmo período de 2019. Havia a expectativa de que 120 milhões de pessoas voltassem ao trabalho até o fim de fevereiro, subindo o contingente de trabalhadores para dois terços da capacidade, que só se restauraria por completo em março, se a epidemia for contida[3].

A China é um agente fundamental da economia mundial, dado o seu gigantesco mercado consumidor e sua grande participação nas cadeias globais de produção. Em 2019, esse país foi um importante parceiro comercial do Brasil e do Espírito Santo. O país asiático foi responsável por 27,3% das exportações nacionais e por 5,3% das exportações capixabas. Em relação ao total importado, 19,9% dos produtos estrangeiros comprados pelo Brasil vieram dos chineses, enquanto o estado teve 18,5% das suas importações vindas da China.

O Brasil e o Espírito Santo podem ser afetados nessas duas frentes citadas, com queda na demanda chinesa por commodities metálicas e de energia, e com falta de fornecimento de insumos industriais como componentes eletroeletrônicos, maquinários, peças de automóveis e produtos químicos[4].

Os impactos também têm sido sentidos no câmbio. No Brasil, o dólar passou da marca de R$ 4,50 pela primeira vez na história no final de fevereiro, com uma onda global de aversão ao risco[5]. Com pouca previsibilidade sobre o futuro do coronavírus, há um momento de fragilidade, especialmente das moedas de países emergentes, em favor de ativos e mercados mais seguros. O último Boletim Focus, divulgado em 02 de março, apontava uma alta na expectativa do dólar para R$ 4,20 ao final de 2020, patamar que pode voltar a subir nas próximas semanas.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) estima, por enquanto, que a epidemia deverá reduzir em 0,1 ponto percentual o crescimento mundial em 2020. O Fundo ainda reduziu a projeção de crescimento chinês de 6,0% para 5,6% neste ano[6]. A LCA Consultores também revisou de 5,9% para 5,5% a projeção de crescimento da economia chinesa, mas ainda não revisou expectativas para o crescimento brasileiro, apesar de considerar viés de baixa. Alguns bancos já colocam a projeção de crescimento do Brasil abaixo de 2,0% para este ano, como é o caso do Bank of America, que estima 1,9%. Já o JPMorgan reduziu a previsão de alta do PIB brasileiro em 2020 de 1,9% para 1,8% em função do coronavírus, esperando por maiores impactos nos resultados do primeiro trimestre com posterior recuperação nos trimestres seguintes[7].

Ainda é difícil dimensionar os impactos futuros para a economia mundial, apesar de ser cada vez mais claro que eles existirão e que terão relevância. Os desdobramentos da epidemia seguem merecendo muita atenção no campo da saúde e nos mercados.

Nota: Conteúdo publicado no Boletim Econômico Capixaba de Fevereiro, divulgado mensalmente pelo Ideies.
[1] Veja mais sobre o desempenho das ações de companhias aéreas e o aumento dos cancelamentos de viagens em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/02/27/turistas-cancelam-viagens-dizem-agencias.ghtml
[2] A queda do Ibovespa naquele dia 18 de maio de 2017 refletiu o fato político do dia anterior, apelidado de “Joesley Day”, em que foi divulgada gravação de conversa entre o empresário Joesley Batista e o então Presidente da República Michel Temer, abalando a imagem do governo e trazendo grande incerteza e preocupação com o andamento da agenda econômica, que de fato foi afetada a partir do episódio.
[3] Veja detalhes em: https://oglobo.globo.com/economia/com-coronavirus-empresas-na-china-atrasam-salarios-oferecem-bonus-quem-volta-trabalhar-24267834
[4] Fábricas de celular no interior de São Paulo já anunciaram férias coletivas e paralisação da produção à espera de componentes importados da China: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/02/fabricas-de-celulares-dao-ferias-coletivas-a-espera-de-componentes-da-china.shtml
[5] Saiba mais em: https://epocanegocios.globo.com/Mercado/noticia/2020/02/epoca-negocios-dolar-supera-r-448-com-cautela-sobre-coronavirus-e-risco-politico-as-reformas.html
[6] Confira mais informações sobre os impactos econômicos do coronavírus em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/02/26/entenda-os-impactos-do-avanco-do-coronavirus-na-economia-global-e-brasileira.ghtml
[7] Veja detalhes em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/02/27/virus-leva-analistas-a-revisar-projecoes.ghtml

Rodrigo Taveira Rocha é mestre em Administração Pública e Governo pela FGV-SP e analista do Ideies.

Os conteúdos e as opiniões aqui publicados são de inteira responsabilidade dos seus autores. O Sistema FINDES (IDEIES, SESI, SENAI, CINDES e IEL) não se responsabiliza por esses conteúdos e opiniões, nem por quaisquer ações que advenham dos mesmos.

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