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Reforma tributária ao avesso


por Samir Nemer

Artigo publicado na Seção Tribuna Livre em 03 de julho de 2021.

A proposta de reforma do Imposto de Renda apresentada há alguns dias pelo governo federal trouxe forte reflexo no mercado ao propor a tributação de lucros e dividendos – hoje isentos – e o fim da possibilidade de dedução dos valores de Juros Sobre Capital Próprio (JCP) das bases de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Aliás, o governo erra não só no conteúdo, como na forma: ao descartar uma revisão ampla e propor uma reforma tributária fatiada, expõe-se ao risco desnecessário de aprofundar ainda mais as diversas assimetrias e contradições que caracterizam nosso sistema.

As medidas propostas pelo Executivo nesta 2ª fatia da reforma, não poderiam vir em pior momento, dado o período de crise gerado pela longa duração da pandemia da Covid-19 no país, que certamente afugentará investimentos no Brasil. O projeto prevê a tributação dos dividendos a uma alíquota de 20% na fonte pagadora, além de tributação sobre remessas de lucros ao exterior à alíquota de 20%, majorada em 30% se a remessa for para paraísos fiscais. Há a previsão, porém, de uma isenção de até R$ 20 mil por mês a microempresas e empresas de pequeno porte.

O projeto também estabelece vedação à dedução dos valores de Juros Sobre Capital Próprio (JCP) das bases de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL). A possibilidade é vista hoje como a maior vantagem deste instituto. Isso porque apesar de serem tributados na fonte a uma alíquota de 15%, os JCP podem ser deduzidos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL por empresas no Lucro Real.

Os Juros sobre Capital Próprio são uma forma de distribuição de lucro comum entre empresas de capital aberto. Na prática, os JCP tem funcionado como uma via de mão dupla: os investidores recebem uma remuneração extra de acordo com o desempenho do seu investimento e as empresas utilizam deles como um artifício contábil para pagar menos impostos.

Ao tributar dividendos e JCP, o governo onera as duas principais formas de obtenção de retorno financeiro, justamente neste grave momento econômico, social e sanitário brasileiro, afastando ainda mais os  investidores. A baixa carga tributária sobre tais rendimentos é um artifício utilizado para compensar nossos gargalos regulatórios e de infraestrutura que há décadas não conseguimos superar, fazendo com que seja minimamente compensatório investir no país.

No momento em que sofremos com perda de investimentos e investimentos geram liquidez para a economia, é inoportuno essa proposta agora, pois torna mais caro para o investidor colocar dinheiro em uma atividade produtiva ou mesmo investir no mercado financeiro brasileiro.

Atualmente tem-se uma tributação de 34% na pessoa jurídica e 0% sobre o acionista, sendo que o projeto, estabelece tributação de 29% na pessoa jurídica e 20% no acionista, aumentando em muito a tributação, além de trazer mais complexidade ao sistema.

Note-se, por exemplo, que ao se criar a faixa de isenção de R$ 20 mil, o que está se fazendo é a aumentar assimetrias e desestímulo ao crescimento das empresas, pois terão um incentivo adicional para continuar pequenas e aproveitarem dessa faixa de isenção.

Em relação ao fim da dedutibilidade dos JCP, será a revogação do próprio instituto, justamente em um contexto de tentativa de recuperação econômica, de busca por melhores condições de mercado, mais competitividade e atratividade de investimento.

A reforma tributária, portanto, precisa ser realizada “ao avesso”.

Samir Nemer é advogado tributarista.

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